Visita em 17-8-2016
Área -11,12 Km2; Densidade Populacional – 20 hab./km2
Evolução da população
1864 | 1878 | 1890 | 1900 | 1910 | 1920 | 1930 | 1940 | 1950 | 1960 | 1970 | 1981 | 1991 | 2001 | 2011 |
364 | 371 | 405 | 444 | 474 | 414 | 453 | 605 | 660 | 613 | 451 | 323 | 245 | 205 | 222 |
Quando as últimas estrelas se apagaram no céu, tinha passado o cemitério de Aldeia da Ribeira, virara à direita, passara o Restaurante da Bernardina e caminhava célere sobre o alcatrão que queria encontrar a Rebolosa a dormir. Mas olhando para leste fui forçado a parar e a registar um nascer do sol fantasmagórico como se a Espanha estivesse em chamas.
Entrei na Rebolosa que os da Vila, com seu hábitos de precederem muitas palavras com um a, a que juntando uma preguiça vocal acrescentam um r, pronunciando Arbolosa. Todos os nomes têm uma história a que muitas vezes se perde o rasto. No caso da Rebolosa, há uma história fascinante que poderão conhecer no livro História da Rebolosa, de Bernardino Pinheiro que consegue explicar através do brasão de armas
Uns atribuem-lhe o nome devido aos reboleiros (carvalhos jovens) abundantes na localidade, outros à existência de moinho(s), ambos representados no brasão. A história relatada por Bernardino Pinheiro consegue combinar as duas teses : os reboeiros e o rebolo.
Cirandei pelas ruas olhando as casas desabitadas, as velhas casas de telha velha, de escadas toscas de granito, de portas e janelas fechadas donde ressoa uma misteriosa voz do passado. Compostas algumas, ainda solidamente vestidas, resguardando a memória dos que lá viveram; outras, porém, em que o fora eo dentro se confundem, desnudas e sem pudor de portas escancaradas, janelas como olhos vazios, sem chapéu que as abrigue. Um lajedo extenso, ladeado a nascente de uma fila de casas baixas, onde se malhava o centeio. Hortas esparsas pelo ribeiro bem cuidadas com picotas apontar o céu. A igreja, com o largo fronteiro, a torre sineira, onde se presta culto à sapientíssima Catarina, padroeira dos filósofos e professores e protetora das mulheres amamentadoras. E talvez aqui lhe seja prestado culto por haver amas que alimentavam os filhos de ninguém, os abandonados na roda dos expostos; talvez, a tradição oral da existênia de um convento de freiras que por aqui teria existido não seja uma invenção sem sentido.
O povo da Rebolosa presta culto a Santa Catarina que tem a sua festa no dia 25 de Novembro. E tem direito a feira, dizendo-se que quem queira matar porco deve vir nesta altura tirar a licença para tal. Só a partir daí se dava início ao ritual da matança do porco. Histórias de sangue ou sanguinárias como as do tempo de Catarina.
Mas há uma Rebolosa nova, com uma face diferente: das casas restauradas, de ruas calçadas de novo, de um vasto largo de festas, de espaços ajardinados. E de um equipamento comum a todas as aldeias que visitei, mas este com muito mais apuro:
Não, não se trata de um coreto mas do lavadouro público. Não sabemos quão uasdo é, mas fica como registo de um equipamento que as nossas mães e avós gostariam de ter fruído. Os locais de lavagem de roupas - rios, presas, lavadouros - eram a rede social mais importante daqueles tempos: Enquanto se lavava a roupa, ali se postava sobre quanto se passava na aldeia e arredores: na taberna, na igreja, no comércio, no mercado, na casa de sicrano e de beltrano, dos namoros, dos piscares de olho, das vidas certas e dúbias, do padre e da professora, tudo esmiuçado. A roupa suja ficava limpa. Quantas histórias!
Uma terra com tradição, com orgulho, gente laborosa, empreendedora, um exemplo a seguir.
Durante muitos anos, assim como uma espécie de eternidade, a vida não mudou. Só muito tarde, quando o meu pádrinho e depois a minha avó materna morreram, é que para mim se tornou inquestionável a conclusão do argumento aristotélica: " Todo o homem é mortal". Até então, morriam crianças, logo promovidas a anjinhos da corte celestial, morria alguém no Cimo da Vila ou no Canto, ou tocavam os sinos a sinal, ou da Irmandade da Misericórdia saíam bandeiras com imagens do outro mundo, mas a morte era uma coisa dos outros, não da família, não dos vizinhos. Na praça durante muitos anos ninguém morreu. Eu nasci lá, cresci sem dar por isso e tudo era sempre igual mesmo as pessoas que por lá passavam eram sempre as mesmas, a menos que ( o que acontecia com alguma frequência) triteiros, caldeireiros, capadores, compradores de peles e outros, por aqui passassem a tratar das suas vidas,tratando da vida dos outros. As casas, sempre iguais, ladeavam a praça onde desaguavam as pessoas e os gados que eu do nosso balcão ( nosso era a palavra da nossa identidade familiar que incluía os familiares e toda a propriedade quer se tratasse da burra, do carro das vacas, ou da Horta da Ribeira) conhecia na perfeição: o tilintar dos chocalhos das ovelhas e das guisas das cabras, a identidade de quase todos os burros e vacas nas suas feições e jeitos. Era um mundo que se repetia todos os dias, todos os meses, todos os anos. E nas casas habitavam as pessoas como se desde o princípio do mundo assim fosse. E assim era porque o mundo tinha começado quando comecei a vê-lo. Ao Cimo da Praça vivia o ti Xico Henriques e a Ti Júlia e, mais tarde o Zé da Ruvina e a Amélia; no correr das casas térreas ( que as casa que ladeavam a Praça eram de escada e balcão como convinha à nobreza do lugar) do Forno onde o povo cozia o pão, vivia uma família que tomou o nome do ofício - Forneiro - e que mais tarde demandariam Lisboa; a seguir confinando as Portas vivia a ti Isabel Periquito ( que me perdoem as alcunhas mas também fazem a nossa identidade ao ponto de como é o caso serem a forma de sabermos de quem falamos - e é caso para dizer que quem nunca as usou atire a primeira pedra. E alcunha, quem a não tem? Como verão também não lhe escapo.) Em frente a este correr de casas temos o senhor Aníbal e a senhora Aninha que tinham o comércio e a taberna acessados pelo Cimento - esse altar profano ou palco, ou tribuna, ou plataforma onde os acontecimentos se tornavam notícia e passavam a ser verdadeiramente reais. Seguia-se a Ti Isabel do Alípio e filha a Maria Pelada - a mãe padeira e a filha uma autêntica amazona Se em vez de mula montasse uma égua; depois, quiçá, na mais antiga casa da Praça a Ti Zabel Afonso ( onde minha mãe me mandava pedir a malga do fermento para fintar o pão) vestida de preto, lenço na cabeça e olhar de humildade pregado ao chão como se a cruz não fosse do seu homem, o ti Zé da Cruz. Na mesma construção, em casa geminada o ti Mergilgo ( simplificações antroponómicas) lavrador e a tia Anunciação Polónia. A Botica das poçôes de outrora passara a local de guarda de instrumentos e produtos agrícolas; confinavam no correr a Dona ( e um título fazia toda a diferença na vida) Vangelina e sua filha D. Maria( a quem devo favores de enfermagem); seguia-se o Senhor João da Cruz - polícia de profissão na cidade da Guarda mas que conheci apenas como reformado - e a senhora Patrocínia Magalhães. Seguia-se uma casa - com uma varanda tradicional - desabitada e onde em dias de chuva, a garotada se abrigava a jogar o " ó ladrão marcha cão " - propriedade do sr Manuel Esperança que seguindo a tradição familiar se estabeleceu comercialmente em Lisboa; já fora da praça e ladeando o largo do Pelourinho, mas bem visível do nosso balção vivia o inconfundível senhor António Lucrécio e sua mulher Mercês ; bem ao lado com escadaria de serventia comum vivia a ti Filomena Rasteira , a ti Mouca tal era o considerável grau de surdez. Ao fundo da Praça era a nossa casa, o nosso balcão de onde eu aprendi a ver o mundo. No ano em que eu nasci - o ano em que começou o mundo como o estou a ver - o senhor Tenente inaugurou o Chafariz que foi construído no quintal da nossa casa. Ora, do nosso balcão eu via todas as mulheres e todas as raparigas que vinham buscar a água para todos os fins a que se destina. E, claro, muitas coisas vinham agarradas ao "ir ao chafariz" como, por exemplo, a namoradeira que gasta mais àgua do que precisa para ter um pretexto. Mas o chafariz merece uma história completa. Aqui na nossa casa viviam os meus pais , o ti João Marques - lavrador, cujo assobio resultava tanto na comunicação com os animais como o fiat do Criador - e a ti Graça, por linhagem de quem nos alcunhavam de Carrachos ( eu sei, mãe, que também não ias gostar de ler esta parte mas é só por causa dos outros não levarem a mal). Ao nosso lado, viviam o ti Zé Badana que aliviava o peso da profissão de pedreiro com o seu quê de zombeteiro e cuja alta estatura contrastava com a da ti Filomena. Do outro lado, no início da Quelha, em casa térrea, vivia o ti Augusto Balão orientando os rituais da cozedura do pão que trabalhar mesmo a sério era com a mulher, a ti Beatriz. Mais uma vez a profissão gera o apelido - ou alcunha - à descendência - Tonho do Forno, Ana do Forno, Zé do Forno. Segue-se a Senhora Glória, viúva de Guarda Fiscal a caminho do Vale da Lapa onde a cultura do linho a obrigava; o senhor Raúl - um pouco agricultor, um pouco sapateiro, um pouco habilidoso, um pouco emigrante - e a D. Zézinha, sua esposa, que exercia o cargo de Regente (professora primária sem curso, para o que era necessário boas informações, influências, jeitos ou favores) na Vila e na Arrifana do Coa. Depois era a casa do meu padrinho João Seixas, polícia e da minha madrinha Assunção que levavam a sério a função de padrinhos. Do nosso balcão não via, mas nas costas da casa do meu padrinho vivia o senhor Zé Franco - a quem meu pai pagava em alqueires de centeio os cortes de cabelo dos filhos - e a senhora Celestinha que passava o tempo todo a fazer renda. Ladeando a praça a Norte estava a propriedade de senhor professor Pinheiro com a casa, o mirante sobre a Praça e coberto de glicínias e um alto muro resguardando o quintal, para onde, apesar do medo e respeito pelo proprietário, a rapaziada não conseguia evitar, que um pontapé mais forte e mal direccionado, lá enfiasse a bola. Não contei. Talvez me tenha escapado alguém. Depois que conheci a morte não pararam de partir. Agora as casas estão fechadas. Quase todas. E o mundo que começou comigo só existe porque o lembro.
(Republicação. Este texto foi publicado, pela primeira vez, neste blog em 24-12-2011)
- Morreu a Bé.
- Quem?
- A Isabelinha do sr Zé Franco.
Bé ou Isabelinha era assim que vizinhos e amigos a tratávamos.
Isabel Araújo Ferreira Franco, filha de Ilda Celeste Araújo e José Ferreira Franco terminou os seus dias, morando desde há algum tempo no Lar da Bismula. Recentemente, estive no lar e tive o gosto de falar com ela sobre a terra e a gente da Vila, nomeadamente sobre seus pais o senhor Zé Franco e a senhora Celestina, seus pais a conversa levou-nos para o domínio dos parentesco. A Izabelinha tinha, do lado da mãe, a ascendência de Araújo, sendo o avô Alexandre Gonçalves Araújo (1861-1944), casado com Mariana Gouveia Fonseca (1875-1954), pai de uma etensa prole e um grande proprietário. Por parte do pai, os Ferreira Franco eram uma família culta e bem educada, com gente no clero - o padre José Ferreira Franco - e no exército - o coronel Franco. Há um ascendente de nome Vicente Ferreira Franco (1850-1915) que é descendente de uma senhora Francesa.
Mais uma conterrânea que termina os seus dias. Aos familiares, de modo particular à irmã Helena, deixamos as nossas sentidas condolências.
Vila do Touro
Visita – 5-10-2016
Percurso – Baraçal-Vila do Touro-Baraçal
Área -22,46; Densidade Populacional em 2011- 8,1 hab/Km2
Evolução da População
1864 | 1878 | 1890 | 1900 | 1910 | 1920 | 1930 | 1940 | 1950 | 1960 | 1970 | 1981 | 1991 | 2001 | 2011 |
1100 | 1179 | 1251 | 1346 | 718 | 705 | 647 | 832 | 881 | 749 | 416 | 403 | 376 | 299 | 183 |
Do Baraçal avista-se, a curta distância, Vila do Touro. Pés na estrada, passo a passo, numa descida suave até atravessar a ribeira do Boi com margens de densos freixos donde provém uma sinfonia feita de um variado trinar de aves como se fosse Primavera. Depois da ribeira, uma subida até chegar às portas da vila. À entrada, do lado esquerdo, deparamos com uma Nossa Senhora dos Caminhos. Todas as aldeias do concelho têm uma Nossa Senhora dos Caminhos. O Soito já tinha o São Cristóvão mas acharam por bem pedir a proteção da Senhora dos Caminhos. A maior parte destes oragos foram construídos após o êxodo migratório. Antes, um simples cruzeiro ou umas alminhas eram suficientes para proteger os caminheiros que se deslocavam a pé ou montados em burros, machos ou cavalos, em distâncias que não iam, em regra, para além dos quinze ou vinte quilómetros. A construção de estradas e o aparecimento ou aumento da circulação automóvel e os perigos decorrentes levaram a estas construções, por vezes, simples nichos ou um simples pedestal com a imagem da Senhora.
De todas as Senhoras dos Caminhos, esta foi a que achei mais bem conseguida na conjugação harmónica dos diversos elementos aos quais a verticalidade de dois ciprestes reforçam a ligação entre o natural e o sobrenatural. Em fundo, um cruzeiro monolítico fala-nos de um outro tempo. Soando a falso o chão verde de relva artificial.
Chegados ao alto monte onde, sobranceiro ao vale da ribeira do Boi que ali se some no Coa, sentámo-nos na parte mais alta da penedia, junto do marco geodésico – o talefe - e dali pudemos abarcar toda a extensa região. Foi este cabeço altaneiro de difícil acesso e de tão largo avistamento que o haveria de tornar eleito para vigia dos movimentos inimigos.
Quando a geografia política mudou, muda a importância do castelo e da vila que cresceu aos pés. Foi o que aconteceu com o Tratado de Alcanizes, no final do século XIII.
Vila do Touro, juntamente com Vilar Maior, Alfaiates e Sortelha foram sedes de concelho até à reforma administrativa de Mouzinho da Silveira no século XIX, passando então a integrar o concelho do Sabugal.
Tem uma arquitetura habitacional muito interessante mas uma boa parte das habitações estão abandonadas e são muito poucas as que foram restauradas. Faz pena olhar para casas que já foram nobres moradas e parecem irremediavelmente perdidas. Na rua de Pedro Alvito encontram-se belas fachadas com janelas muito interessantes. Felizmente, preservaram o nome de D. Pedro Alvito, mestre da Ordem dos Templários e concedeu foral à povoação em 1 de Dezembro de 1220.
Enfim, nem a exortação inserta em postos de abastecimento de água, “Amigos a União Faz a Força” parece reunir o poder necessário para encontrar um horizonte de esperança.
Antes de 1958
As obras na Igreja matriz não se vão limitar à colocação de um telhado novo. Pelo andamento das obras apercebemo-nos que haverá também uma intervenção na Torre da Igreja, cuja extensão e profundidade desconhecemos. A mesma desde que foi feita nunca sofreu qualquer manutenção pelo que se foi degradando. Estamos em crer que a intervenção terá o acompanhamento de profissionais à altura e que as obras a executar melhorarão a sua estética. A torre de época medieval foi alteada (toda a parte executada em tijol e cimento) há 57 anos. A fonte documental, para além do testemunho do executante, é do boletim paroquial Terras de Riba-Côa que em 11-11-1959 noticiava:
«Iniciaram-se as obras de alteamento da Torre»
A iniciativa terá sido do padre Manuel Narciso, pároco à época da freguesia e o desenho poderá ter sido de António Palos, tenente reformado do exército, e figura proeminente na vida social e cultural da vila no terceiro quartel do século XX. O executante da obra pertence a uma escola de profissionais no trabalho dos novos materiais - o cimento e o tijolo - que vinham competir com o tradicional uso da pedra. Trata-se da família Seixas. Primeiro do Zé Seixas (1884-1948) que além de muitas obras particulares (sendo caraterísticas algumas sacadas em cimento) executou as pinturas do coro da Igreja da Vila, nomeadamente o brasão da vila que ficou oculto aquando da colocação do pára-vento da entrada, por baixo do coro. Dada a mestria do seu trabalho era muito requisitado por gentes de terras vizinhas, citando a título de exemplo a referência feita na interessante monografia sobre Valongo - Terra, Vida, Alma -, a propósito das obras no estabelecimento comercial cuja descrição arquitetónica termina assim: «... e beiral do telhado de características sui generis (único), feito por um dos maiores mestres de sempre de toda a zona 'o Seixas de Vilar Maior'» Foi com este mestre que o filho António Seixas, aprendeu a arte e foi com ele que o senhor Reitor e o senhor Tenente (assim eram tratados) contrataram a execução da obra no valor de três contos, apenas a mão de obra. Poderá hoje parecer uma obra fácil. No entanto, considerada à época, tudo subido à força braçal, sem ajuda de máquinas, poderemos dizer: -É obra!
E aquela pirâmide quadrangular apontando os céus e o relógio que passou a contar o tempo e a anunciá-lo badalando as horas, eram, sem o saber, o anúncio de novos tempos.
A Torre da Igreja em 2-11-2016
Como será a torre a seguir?
Só hoje, dia 6 de setembro de 2024, ao visitar o blog, reparei que passaram oito anos sem dar resposta à pergunta sobre o amanhã.
Mesmo aqueles que não gostaram de ver assim a torre se foram habituando. Que remédio...
Fosse no tempo em que este blog se antecipou às redes sociais e estou a ver como o pessoal ia reinar! Então, ficou assim.
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