Desde já felicito o fotógrafo a quem peço desculpa pelo (ab)uso da imagem que recolhi do facebok. Tenho várias fotos sobre o tema mas confesso que esta me agrada mais. A senhora é-me conhecida, o burro também e a paisagem familiar. Diria que é a estrada Aldeia da Ribeira - Vilar Maior. Cada vez mais rara, esta é uma cena típica do concelho do Sabugal. Em termos históricos (sim, a História também é feita por carroças, burros e pelos seus proprietários) este tipo de transporte surge nos anos sessenta quando começa o exôdo migratório para França e os lavradores se desfazem da possante e pachorrenta junta de vacas, do respetivo carro (maciço, pesado, de rodas de meia lua em madeira cravejada de ferragens), do arado, da charrua e demais arreios pondo termo a uma economia secular do trato da tapada de centeio, da cultura de regadio (sobretudo a batata mas também o linho) e da vinha complementada com a piara do gado. Na impossibilidade de continuar com uma estrutura tão pesada - é mais difícil alimentar uma vaca do que meia dúzia de burros -, as mulheres que ficaram encontraram uma solução: o burro e a carroça.
Se quiser viver no interior e quiser prover ao seu integral sustento esta é a situação ideal. Sem estar dentro dos preços, diria que com dois ou três mil euros terá carroça, burro e respetivos arreios e acessórios. Com o burro tem assegurado um transporte seguro, barato e não poluente. Poderá fazer uma economia circular, uma agricultura inteitamente biológica, sem emissões de dióxido de carbono. Com o burro poderá lavrar a terra, transportar todo o tipo de produtos , incluindo o estrume que ele abundantemente produz e ter uma agricultura próspera, fazer uma cultura de regadio à custa do burro, (arranje um chão, horta ou veiga que disponha de uma nora).
Então, se começa a ficar entusiasmado, começe o projeto. Eu sugiro que vá para o interior, para os designados territórios de baixa densidade, de preferência para uma das quarenta e tal aldeias do concelho do Sabugal. Aqui tudo chega mais tarde ou nem sequer chega, como acontece com o vírus que graça por todo o planeta. Todas as aldeias têm os seus encantos naturais, a sua identidade, a sua história. Poderá optar por comprar a casa onde quer viver ou poderá arrendar (há muita oferta). Poderá comprar um terreno, arrendar ou até alguém lhe poderá ceder através de um contrato de comodato ou sem contrato. Depois decida se compra um burro ou uma burra. Para além da casa, do terreno, da carroça e do burro não se esqueça de comprar a melena, uma albarda (quando não quiser andar de carroça e preferir disfrutar da montada), o respetivo cabresto e rabeiro. E, claro (não compre, arranje você mesmo) uma vara que para além de conduzir a besta lhe virá a ser muito útil como, com tempo , descobrirá. Como irá descobrir muitas outras coisas. Mas isso também faz parte da parte interessante.
O burro é um animal frugal, comunicativo, muito resistente, comunicativo, inteligente e bom companheiro. Não compre relógio ou despertador porque ele é que lhe vai ditar o tempo. E acredite que se a voz de burro não chega ao céu, ela chega mais longe que qualquer outra.
Vá lá! Se entre o Ferrari ou o Tesla optar pelo burro, eu dou uma ajuda.
Propositadamente, em relação ao post que escrevi , "Piscina em Vilar Maior", fui suscinto e factual para que os possíveis comentários se centrassem sobre a obra em si. Daí resultou que as pessoas puderam exprimir as suas posições sobre o assunto, a maior parte, direta ou indiretamente, sob a forma de perguntas;
- Esse projeto foi exposto ao povo?
- A piscina: a quem se se destina? Quem se vai responsabilizar por ela? Quais os custos associados?
- Esse projeto acrescenta valor a Vilar Maior?
- Os meios de publicitação da venda de propriedades ( da Irmandade da Misericórdia) foram adequados?
- As Assembleias Gerais não deveriam ser marcadas para alturas em que pudesse estar o maior número de pessoas? Na era da digitalização não seria possível participar sem presença física?
- As pessoas residentes fora de Vilar Maior não têm direito a ser informadas?
- Há problemas jurídicos nas vendas efetuadas?
- Deve haver (há) interdependência, independência, articulação, solidariedade entre as instituições/órgãos de - Irmandade, Junta, Associação, mordomia do Senhor dos Aflitos?
- Quem está a pagar a pscina?
- A piscina "será mais uma aberração a que Vilar Maior já nos vai habituando"?
Ficam as perguntas, aguardam-se as respostas.
A Irmandade da Santa Casa da Misericórdia tem em fase adiantada a construção de uma piscina. Para o efeito vendeu as propriedades que tinha em Vilar Maior e em Aldeia da Ribeira. Eu não pertenço à Irmandade, não participei, por isso, em qualquer reunião, nunca li nenhum documento ou informação sobre o assunto. Tudo o que sei é do que ouvi.
Os da minha geração recordam-se bem do espírito belicoso que opunha as duas aldeias vizinhas que entre outros aspectos, se manifestava na maior festa de cada uma das aldeias na quantidade de foguetes que cada uma lançava para o ar. Eram recorrentes as histórias, em forma de epopeia, que de um lado e do outro se contavam em que os actores principais eram os rapazes solteiros.
Na sequência de desentendimentos e conflitos entre os habitantes das duas freguesias reuniram no dia 17-11-1852, as juntas de freguesia presididas por dois homens de grande autoridade que eram párocos das respetivas freguesias.
Acta da Reunião
(Vertido para Português atual)
«Reunidas as Juntas de Paroquia desta Vila e Aldeia da ribeira para deliberaremsobre o mais conveniente meio de proceder na administração e guarda do Montado das Razas, pertencente às ditas paróquias, depois de maduramente discutirem o que fosse mais acertado para levar-se a efeito a conservação do montado, acordaram o seguinte:
1º - que todo e qualquer vizinho de ambas as paróquias tem direito a tomar em dia de S. Martinho de cada ano uma raza somente na folha correspondente
2º - que nesta rasa que lhe toca pode arrancar toda a lenha bastante que for para uso de sua casa somente sem direito a vendê-la ou dá-la a outro qualquer vizinho.
3º Que será senhor de arrancar lenha até ao dia 25 do mês de Março de cada ano findo o qual dia as razas devolvidas(?) à paróquia, salvo o que a cultivar, que até terá direito … na sementeira o Zoço(?) que renascer depois da estravessa do terreno, não cortando lenha alguma, digo lenha ou Zoço(?)de outra natureza na sua própria raza.
Para cumprimento exacto do artigo 1º, as juntas farão distribuir um bilhete a cada vizinho, o qual, depois, de tomada a raza apresentava ao escrivão respectivo, declarando com quem parte de um e outro lado para se sindicar da sua veracidade e transgredido o dito artigo perde o direito às razas que tomava e pagará multa de três mil reis, metade para o denunciante e metade para s despesas da paróquia e será punido correcionalmente; e na mesma multa incorrem os que transgredirem as disposições do artigo 2º e 3º.
Acordaram mais que nenhum vizinho tem direito a arrancar lenha em folha diferente que no ano se constitui; que os guardas do Montado são estritamente responsáveis do bom arranque e (?) cuidado do Montado (…)
Acordaram mais que nas disposições do artigo 2º que nenhum vizinho tem direito a ceder a sua raza para um segundo a cultivar tem somente o usufruto (…)
A tomada das razas será ao sol nascer.
O Escrivão da Junta da Paróquia extrairá duas cópias que serão lidas de viva voz pelo mesmo, no domingo, 21 do corrente ao Povo para que não haja ignorância e depois afixada no lugar público, e por este ano será a tomada da raza correspondente na manhã do dia 22 do corrente ao sol nascer. »
Assinam os Presidentes da Junta:
Aldeia da Ribeira – João de Mattos
Vilar Maior – Jozé Ignácio de Farias
Quem quiser saber o que se passa na Vila tem que ir à Praça. Sempre foi aí que a vida passou, desde as banalidades dos dias comuns às celebrações profanas dos garotos e das cantigas de roda e bailes dos rapazes e das raparigas. Quem, de fora, tinha assuntos a tratar, era aí que o fazia ou iniciava. Por vezes, os personagens mudavam mas a liturgia era a mesma, como a chegada do correio: Primeiro o ti Agostinho, de Aldeia da Ribeira, montado numa mula, depois o ti Chico Mónica, montado na bicicleta e depois outros e outros que traziam e levavam as notícias para o mundo. O jogo da Arraioila passava de pais para filhos sempre com gestos e jeitos iguais. O Cimento, esse altar profano, era o palco onde em cenas não ensaiadas, actores efémeros esbracejavam, questionavam, discutiam, concordavam, riam, troçavam. Por vezes, incendiavam-se os ânimos, afloravam iras, ódios e vinganças e a tragédia acontecia.
Hoje, um pouco alterado, o cenário é o mesmo, os actores mudaram. De manhã, ao levantar-me, da janela do meu quarto, era assim. Em vez dos burros com enchalma colorida e, anos depois o autocarro da "Viúva Monteiro", uma carrinha com um único passageiro, a caminho do Sabugal. No Cimento meia dúzia de atores mascarados.
Chegado à Vila, fico agradavelmente surpreendido com as imagens que aqui vos deixo. Uma instalação pentagonal ao fundo da Praça que nos leva ao século XIX em que na área do atual concelho havia cinco municípios, cinco vilas, cinco concelhos, cinco castelos: Três na margem direita do rio Côa - Sabugal, , Alfaiates e Vilar Maior, constituindo a região de Ribacoa e dois na margem esquerda - Sortelha e Vila do Touro
Foram instaladas várias placas com a indicação dos monumentos que na Vila merecem ser visitados.
Finalmente foram sustituídas as várias placas descritivas de cada um dos monumentos.
Até o relógio da torre acertou o tempo.
E pronto, passados 11anos, temos placas de sinalização e além da de Aldeia da Ribeira que sempre lá esteve, já ninguém se perde, já ninguém se engana. Claro, a Bismula deveria ter o mesmo direito que Aldeia da Ribeira. Os mais exigentes hão-de dizer isto e aquilo: do barroco pretendente a obra de arte, do aspecto selvagem da ervagem, da manifesta desordem dos vários elementos, do excesso de placas inúteis. E que tal pensar numa coisa que ficasse bem?
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