Demasiado depressa chegou o dia de vos falar de uma Rainha chamada Beatriz.
Agradecimento a todos os que nos acompanharam, na sua passagem para "o reino dos Céus"
esta era a sua reconhecida crença!/Fé
Nasceu Princesa de Vilar Maior em 1930, destinada a ser, como foi, a minha rainha.
De família muito pobre, e onde tudo faltou, como à “demasiado” grande maioria do povo de Vilar Maior, nos terríveis anos de inico a dois terços do século XX.
A família organizou-se à volta do patriarca, o meu avo Miguel, minha avó Gracinda e filhos, a primogénita Beatriz, Joaquim, Carolina e António. Os valores eram HONRA TRABALHO, TRABALHO…TRABALHO e …no lugar da PÀTRIA encontrávamos, no seio da família AMOR muito AMOR, apesar da rigorosa disciplina, nesses tempos, obrigatória para se sobreviver.
Assim cresceu Beatriz cheia de vida e feliz, como a maior parte dos jovens de Vilar Maior, por a vida ser difícil, eram aproveitados os momentos de festa e vividos com grande intensidade e alegria.
Para contexto, lembrar que atravessávamos a duas grandes guerras mundiais a que se juntou a também terrível guerra civil espanhola.
Alguns, muito poucos aproveitaram para enriquecer explorando o minério da região e os demasiado muito pobres para “passarem” o minério para o lado espanhol.
Beatriz já aí era guerreira, fazendo quilómetros, levando cargas de minério, às costas para lugares bem dentro de Espanha, em aventuras dignas de cenas de cinema que envolviam sacrifício físico e perigos inarráveis aos quais não faltavam perseguições e tiros dos “carabineiros” policias espanhóis.
Em 1955, Beatriz casou feliz com o, por ela e só por ela escolhido príncipe de Vilar Maior, Zé Jerónimo.
Mas o ano ficou marcado por um fatídico acontecimento, o meu avô Miguel, pai da Beatriz morre assassinado, …tudo mudou Beatriz na sua primeira gravidez e toda a família se vê obrigada a passar por uma situação incompreensível, o maior dos pesadelos e… impossível de aceitar.
O rumo da vida mudou radicalmente para uma família sem o patriarca e condicionou o seu futuro impiedosamente, retirando alegria e meios de subsistência já de si escassos por aqueles tempos e terá sido aqui que procurou alguma força suplementar na sua religião, aumentando a sua Fé.
A nossa princesa Beatriz ficou para sempre marcada, perdeu alegria viu -se obrigada a ficar mais “rija” ultrapassar esses dias, meses, anos, …toda a vida desta enorme perda e teve de apoiar a minha avó Gracinda e seus irmãos mais novos.
A vida, como o tempo, inexoráveis não param!
Beatriz batiza o primeiro filho a que chama Miguel em memoria do pai, seguem-se a Júlia e o Zé Manel.
Poucas semanas após o nascimento do ´Zé um incidente com um candeeiro queima com petróleo a arder a face do bebé, Beatriz tudo fez para diminuir os danos numa correria à procura de para médicos e literalmente nunca mais largando o zé mesmo enquanto trabalhava e para o resto da vida gosto de dizer que mesmo à distância senti esta proteção divina de Mãe.
Anos mais tarde confidenciaram à Beatriz que o Zé era muito bonito e talvez tivesse sido demasiado bonito, … ela concordou!
Em 1961 o Zé Jerónimo emigra para o Reino de França, como se dizia “tentar a sorte” fugindo à miséria a que a demasiado grande maioria o povo de Vilar Maior estava destinado, meses depois junta-se a Beatriz com os três filhos, também eles numa passagem a “SALTO”, recordo para sempre a amizade com o organizador desta passagem, o Vicente da Nave.
Do reino de França recordo a Felicidade da família e o “mais que grande” orgulho da Beatriz em francês “fierté”, pelo reconhecimento no bairro onde viviamos, fica para sempre os 100 Anos de Mèmère, da incondicional amizade da Madame Cartier e os seus gatos.
Foi com esse orgulho, e aí sim vaidade, que recordo Beatriz a assistir na primeira fila a entrega de prémios escolares do filho sob admiração, alguma inveja e talvez incompreensão à mistura de alguns outros pais franceses.
Desde muito cedo que Beatriz assumiu que a geração seguinte melhor vingaria com a aposta no ensino e foi com esta convicção que no início dos anos setenta decidiu enviar os filhos para Portugal onde foram colocados em colégios em regime de internato, foi um sucesso em termos intelectual amas a separação entre pais e filhos, demasiado dolorosa. Até fisicamente recordo o Zé com peso a mais para a idade e passado um ano tinha peso a menos.
Beatriz decidiu regressar a Portugal para se juntar com os filhos o Zé Jerónimo viria depois, assim a Beatriz encontrasse casa na Cidade da Guarda.
O Zé Jerónimo nunca mais voltou a reunir-se com a família e Beatriz só com o seu trabalho, melhor “trabalhos”, coragem e determinação que inclui uma horta manteve os filhos a estudar, com o reconhecimento e admiração de todos os que a conheceram. Teve muitas vezes que aplicar, contra vontade disciplina, rigor e exigência para com os filhos…reconheço, tinha mesmo de ser!
Nunca Faltou amor, recordo tempos de adolescência em que os primeiros amores ferem e, à Beatriz, a quem passei a tratar de “MMA”, pedia colo e ela largava tudo, inicialmente incomodada com a falta de tempo, porque tinha sempre imensas tarefas/trabalhos. Deitava-me com a cabeça no colo da MMA e curava tudo...dizia-me eu sei Zé, acariciava-me esquecia o tempo que não tinha e dava-me todo o tempo do mundo até me sentir melhor ... e a MMA repetia ei sei Zé, e… só com isto sentia-me compreendido, nessa adolescência que nenhum dos que são adolescentes compreenderão alguma vez! O colo da MMA tudo curava! E eu toda a vida lhe pedi colo!.. como quem pedia a Bênção à Mãe. Na Vila, cientes do poder da mãe os filhos diziam “dê-me a sua Bença mãe”.
Crescemos, …a vida separou-nos, tivemos que ir à luta com a Beatriz como exemplo, recordo os momentos dos reencontros, casamentos, alguns dias de Natal, nascimentos dos netos, … todos com linhagem da Princesa Beatriz!
Não estivemos mais juntos porque os terríveis enjoos/vómitos de que padecia nas viagens, não nos permitiam exigir o seu sacrifício.
Dos filhos, netos, bisnetos e de todos os que tiveram o privilégio de a conhecer, sobra a consensual admiração, carinho, amor pela nossa PRINCESA BEATRIZ!
…e… eu…PERDI O MEU COLINHO MMA!
Texto de José Manuel Fonseca